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quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Dualismo


No chão
O pavão
Formoso

No telhado
O corvo
Feio
Agourento

[ Dualismo
Tão antigo
E
Tão novo ]

Eternidade
É
O momento

27 comentários:

Anônimo disse...

Um pavão se admirava na beira do lago, se olhava na água e se perguntava:
- Sou feio? Sou bonito?
Quando via a cauda aberta em leque, toda verde, roxa e azul-brilhante, se achava lindo e elegante.
Mas quando olhava para os pés e seu andar desajeitado, ficava até desanimado. E se escondia envergonhado.
Um dia, ele recebeu um convite para uma festa no céu, que devia ser ainda mais bonita que a tal do sapo. Abriu e perguntou:
- Será que isso é bom? Será que é ruim?
Sempre que precisava ter uma opinião, ficava assim.
- Claro que é bom – disse o pombo-correio.
- Festa é sempre bom.
E ele achou que era bom.
Abriu a cauda e ficou se admirando. Depois, ensaiou uns passos de dança. E ouviu as gargalhadas de um tangará dançarino que, bem ao seu lado, treinava para a festança:
- Que bicho mais desajeitado! Este baile vai ser engraçado....
Ficou todo sem graça e se fechou.
Aí chegou um pardal e assim falou:
- Que tristeza é essa ?
- É que eu danço esquisito...
- E quem vai reparar nisso num bicho tão bonito?
E o pavão, elogiado, abriu a cauda com pena pra todo lado.
Mas, de mau jeito, acabou perdendo uma, lá no canto direito.
Foi uma tristeza danada. E lá ficou de novo, todo encolhido, de cara amarrada.
- Por que todo esse aborrecimento? – Perguntou o periquito, que passava nesse momento.
- Perdi uma pena e isso é ruim.
- Ruim uma ova. É sinal de que vai ganhar outra bem nova.
Com isso, o pavão se animou e abriu seu leque.
Aí chegou o bem-te-vi e riu muito engraçado:
- Olha o pavão de rabo banguela!
Já se sabe: o pavão encolheu a cauda, tratou de sumir com ela.
E ficou assim a tarde toda, abrindo e fechando, abrindo e fechando, mudando de idéia com cada bicho que ia encontrando.
No fim do dia estava suado, cansado, de língua de fora, exausto de abrir e fechar a toda hora.
Resolveu: não ia mais. Mas também não ficava ali para todo mundo rir dele. Viu uma moita e se escondeu atrás.
Aí ouviu uma conversa do outro lado:
- Nem agüento mais esperar o baile. Que festança vai ser essa...
- É mesmo! Comida boa, água fresquinha, muitos amigos e música à beça....
O pavão foi até lá, ver quem tinha tanta animação.
Não era pássaro colorido, nem dançarino, nem de boa canção.
Era um casal de urubus.
Foi a vez do pavão rir deles, abrindo suas penas verdes e azuis.
- Vocês não se envergonham? Feios assim e cheirando ruim? Quando vocês dançarem, todo mundo vai sair.
Vai nada... - respondeu o urubu.- Todo mundo está mais ocupado, tratando de comer e beber, de cantar e dançar, de se ver e conversar.
E se alguém quiser, pode rir.
Não é por isso que vou deixar de me divertir.
E a urubua completou:
- E tem mais: não tem essa de feio e fedorento, não, ouviu?
Urubu é tão bonito, da cor do jamelão e do jaguar, da jabuticaba e da noite sem luar....
E quando o pavão abria o bico e se espantava, ela continuou:
- Você é que é feioso, com esse rabo escandaloso, abrindo e fechando que nem gaveta. E nem ao menos tem a cor preta.
Todo esse verde, vermelho e azul, cheio de bolinha.....
Mas a última coisa que disse foi com um sorriso manhoso e olhar dengoso:
- O que vale é que você tem uns pés que são mesmo uma gracinha...... E depois, isso de bonito ou feio é só questão de recheio.
Aí o pavão teve que rir.
E depois que os dois saíram voando, ele ficou pensando:
- Feiúra de lixo ou beleza de artista não depende do bicho, mas do ponto de vista. Cada um é diferente e o que importa é mesmo a gente.
E lá foi ele animadíssimo para uma festa bem divertida.
Ainda bem. Se não, ficava naquele abre-e-fecha toda vida.
(desculpa o tamanhão do comentario)
Bjs.

Vanessa Vieira disse...

Simples e ao mesmo tempo fantástico Zélia! Adoro seu jeito de escrever... Parabéns!

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mr.Orange disse...

Zélia, adorei seus textos! Não tenha medo de publicá-los e nem pense que tudo foi escrito, pois tudo e todos mudam.
Todos nós alguma vez na vida iremos trombar com essas duas figuras: o pavão mostra toda sua onipotência e grandiosidade colorida enquanto o corvo fica somente esperando o momento certo de mostrar sua escuridão, fazendo assim uma forma parecida com a de um eclipse. Acho que viajei demais, mas adorei a forma como escreve!
Estou seguindo seu blog e coloquei um link dele no meu. Quando tiver tempo dê uma passada lá, seria uma honra!
http://queletra.blogspot.com/
Atenciosamente. Adriano MB.

Bessa disse...

Querida Zélia, bom dia!

ave misteriosa e sagrada, o pavão sempre me encantou quando distende o mandala de suas plumas atrás de si. Já o bem menos suntuoso corvo, diverte-me com a inteligência que tem em achar soluções que o pavão sequer saberia imaginar.

As aves se completam, a nós de compreender esse dualismo de que você, em suas letras, tão belamente nos falou.

Um grande abraço, amiga poetisa, meu carinho.

André

Osvaldo disse...

Querida Zélia;

Tão belo poema para mostrar o belo e o feio, mas quantas vezes o feio tem mais beleza interior que o próprio belo!!!...

bjs,
Osvaldo

ValeriaC disse...

Fascinante como voce coloca profundidade no que escreve... maravilhoso!

Doce dia querida...beijinhos...
Valéria

Ingrid disse...

Zélia,
é a reunião de tanto em tão pouco..
perfeito!..
beijos..

Tania regina Contreiras disse...

É verdade, Zélia, querida... em todos os tempos, coexistem os pares de opostos, e o teu poema, só pra variar, traz a beleza da simplicidade que poucos puderam alcançar. Aprendo contigo cada vez que te leio.
Beijo grande,

Dilmar Gomes disse...

Querida amiga Zélia, lembrei do pavão misterioso do Ednardo, lembra dele?
Pois é, mas o seu pavão é mais formoso!
Você está corretíssima; o dualismo, o agora, são componentes da eternidade.
Um grande abraço, amiga.

Cris de Souza disse...

simples mente bela...

beijo, passarinha!

Anônimo disse...

Olá, Zelia, amiga!

Este nosso rico mundo está povoado de contrastes e de(pre)conceitos:A beleza, diz-se, encontra-se nos olhos de quem olha, e, imagine-se, que até a "feia" coruja acha que tem uns filhotes lindos...
Pela parte que me toca,devo dizer que gosto tanto dos bonitos corvos, como dos lindos pavões.
E também gosto muito de vir até aqui, o que também já não é novidade!

Abraço amigo.
Vitor

Paulo Vitor Cruz, ele mesmo disse...

era uma vez um leitor encantado. ele n sabia o que dizer.

*bacanissimo..

abs grande.

silvia zappia disse...

relidad y magia
qué hermoso poema!

besitos*

Domingos Barroso disse...

sob esse teu olhar dourado
tudo logo se revela
uma chama de reflexão
...

carinhoso abraço,
elevada poetisa
minha amiga.

Anônimo disse...

Lindo contraste, e lindo jogo de palavras, Zelinha!

Beijo.

Unknown disse...

MUITO! MUITO LINDO, Zélia!

A cada dia mais cresce minha admiração por seus poemas!

Beijos

Mirze

Dilberto L. Rosa disse...

Adorei o pavão, a borboleta, teus limites, tua Poesia... Gosto de poemas assim, "finos", agoniados, espremidos, mas cheios de significados caindo dos versos univocabulares... Escrevi poemas assim, mas foram poucos: gosto desta tua fase, portanto! Mas o tempo nunca é vão e sempre dirá coisas novas - até para o expectador mais incauto... Grande abraço, prazer ter estado aqui!

Em@ disse...

Zélio, gostei e lembrei-me que estas duas aves têm significados diferentes em locais diferentes. O corvo não significa só agouro,mas também conhecimento sobrenatural e as penas do pavão também signicam lágrimas/penas/sofrimento.
beijo

Marcantonio disse...

Mas é o corvo de cima do telhado que diz (ainda que o pavão, do chão, não corrobore): Eternidade além do momento? No more!

Abraço, Zélia.

Justine disse...

Verdade eterna, poetisa: o feio é necessário para que reconheçamos o belo. De tudo precisamos na vida...
Abraços

Jorge Pimenta disse...

zelita,
a eternidade é o momento...
o tempo é, pois, feito de eternidades e de brevidades inúteis. não será chronos quem o determina, mas cada um de nós e a sua capacidade de ler os ponteiros do relógio da vida.
belíssimo!
beijos!

Cida disse...

Onde nós outros enxergamos dois pássaros, você enxerga poesia...

Amo essa sua forma de olhar o mundo.

Beijos, e tenha um lindo final de semana.

Cid@

Cris França disse...

Zélia,

Hoje vim aqui para deixa um beijo especial, e agradecer por você fazer parte da minha história, tem um selinho para você lá no blog!

Toninho disse...

E na vida é pura sabedoria esta de transitar entre as dualidades e delas retirar o sumo da vida,pois daí vem os mais variados conceitos de belo e feio, bom e ruim.Voce Zelia esbanja criação neste seu poetar impar.Fico só admirando.Sempre meu abraço de paz e luz em seus dias de tão belas inspirações que nos enchem de prazer nesta pagina.Felicidades amiga.

Sidney Andrade disse...

Lembrou-me Clarice Lispector: "Se em um instante se nasce e se morre em um instante, um instante é bastante para a vida inteira."
Qualquer coisa eu lembre Clarice é bonita por natureza. Poema forte, feito pavão-abutre.

Em@ disse...

mil desculpas pelas gralhas l+a de cima,Zélia...
corrigindo:
ZéliA, gostei e lembrei-me que estas duas aves têm significados diferentes em locais diferentes. O corvo não significa só agouro,mas também conhecimento DO sobrenatural e as penas do pavão também signiFIcam lágrimas/penas/sofrimento.
beijo
________
mania esta que eu tenho, de escrever e clicar no enter sem reler!nunca mais aprendo! beijo